O conceito de criança parentalizada, surge de um modo mais claro no final dos anos 60, referindo-se à criança que assume responsabilidades parentais em contexto familiar como resultado da situação económica ou social. Nos últimos tempos, diversas investigações têm sido desenvolvidas como forma de compreender os impactos a nível psicológico, emocional e até mesmo funcional que derivam desta inversão de papeis, avaliando as repercursões ao longo da vida do sujeito.
Neste sentido, os autores exploraram o tema, compreendendo as dinâmicas familiares. Uma das definições refere-se à criança que se assume como figura parental dos próprios cuidadores. A inversão de papéis, pode incluir a defesa e cuidado da figura parental ou surgir como cuidador dos irmãos, neste sentido é a criança que toma as decisões que deveriam ser executadas pelas figuras parentais. Os investigadores indicam assim, a transgressão dos limites geracionais, que dizem respeito a regras implícitas ou explicitas bem como as expectativas que orientam as relações familiares, nas quais a criança parentalizada vê as suas responsabilidades e ações invertidas, tendo efeitos no equilíbrio do sistema familiar e comprometendo o desenvolvimento da criança.
Neste seguimento, surgem algumas teorias que pretendem compreender o processo de parentificação, sendo referido que cuidadores que durante a sua infância não viram as suas necessidades suprimidas, tendem a procurar satisfazer as suas necessidades, sobretudo emocionais através do seu filho, sendo estre processo transgeracional e decorrente das experiencias de vida das figuras parentais. Importa salientar a existência de dois tipos de parentificação a instrumental – consiste na atribuição de responsabilidades funcionais pagar as contas, confecionar as refeições, toda a logistica associada a manutenção da casa. Este subtipo pode ocorrer em casos cujas figuras parentais estão incapacitadas de cumprir as suas funções podendo o mesmo ocorrer por doença, abuso de susbtâncias ou outros motivos.
Segundo a literatura é considerada menos prejudicial, uma vez que pode promover sentido de competência e autonomia na criança; A emocional – consiste em esperar da criança a capacidade de compensar necessidades emocionais ou psicológicas dos cuidadores. É considerada mais disruptiva do ponto de vista desenvolvimental, uma vez que são esperadas capacidades de resposta perante a figura parental, que a criança pode não ter ainda desenvolvidas dentro de sí, surgindo como suporte em momentos de crise ou sofrimento psicológico. Os autores salientam a co-ocorrência com a parentificação instrumental, estando maioritariamente associada a sistemas familiares em que as figuras parentais sofrem de doença mental ou dificuldades de vinculação. Importa salientar a inexistência de reciprocidade na relação estabelecida entre os cuidadores e a criança, o que associada à dificuldade de consideração das características da criança, como a idade, maturidade e capacidade de compreensão, encontra-se associado a um maior número de consequências negativas para o sujeito.
Neste sentido os autores, procuram compreender o impacto da parentificação na idade adulta, observando que ao longo do seu percurso, estes indivíduos tendem a adotar papéis de cuidador, desenvolvendo um auto-conceito adaptado a tarefas que envolvem o cuidado do outro, desenvolvendo o denominado “ síndrome de cuidador” nas diversas áreas de vida, nomeadamente profissional.
Contudo deve salientar-se a reduzida literatura sobre o tema, sobretudo no que diz respeito ao impacto a longo prazo na vida da criança. Dos estudos considerados, foi possível compreender uma preponderância de surgimento de patologia depressiva ou ansiosa em crianças parentificadas, como resultado do excesso de responsabilidade e da imaturidade cognitiva e recursos emocionais de que dispões durante o período da infância e adolescência.
Do ponto de vista das relações interpessoais, podem ainda verificar-se padrões de vinculação insegura ou evitante, uma vez que estes indivíduos não detiveram ao longo do seu desenvolvimento a possibilidade de desenvolver padrões relacionais positivos que servissem de base para as suas relações futuras.
Perante a consideração do impacto desenvolvimental, ressalva-se a importância de acompanhamento psicológico como forma de ajudar a criança ou jovem a compreender as funções e os papéis familiares, associar as responsabilidades às figuras, bem como a exploração do mundo emocional como forma de compreender o desenvolvimento e estabelecimento de relações seguras com base na reciprocidade.
Um até já, Psikiko.
BB.
Referências Bibliográficas:
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Engelhardt, J. A. (2012). The developmental implications of parentification: Effects on childhood attachment. Graduate Student Journal of Psychology, 14, 45-52.
Masiran, R., Ibrahim, N., Awang, H., & Lim, P. Y. (2023). The positive and negative aspects of parentification: An integrated review. Children and Youth Services Review, 144, 106709.
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